Quinta, 09 Outubro 2025 12:36
Evangélicas vítimas de violência sofrem com cobrança da igreja: "Ora pouco".
Quando contei ao pastor que meu marido me agredia, ele me disse: 'irmã, você está orando pouco.
O relato de Cássia* e de outras mulheres ouvidas pelo UOL ajudam a explicar o número revelado por um estudo recente: 42,7% das evangélicas no país já sofreram violência doméstica. Segundo o último Censo do IBGE, os evangélicos são o grupo religioso que mais cresce no país. A pesquisa "Visível e Invisível: a Vitimização de Mulheres no Brasil", a primeira do Fórum Brasileiro de Segurança Pública que usa a religião declarada como indicador, considerou apenas as religiões cristãs e apontou que o número também é alto entre as católicas: 35,1%. "Não podemos concluir que ser cristã coloca a mulher em situação de maior vulnerabilidade", diz Juliana Brandão, uma das pesquisadoras do estudo. "Mas, ainda que seja necessário se aprofundar nos contextos sociais por trás dos números, eles acendem um sinal de que o papel das instituições religiosas também é um indicador a ser considerado em casos de violência contra a mulher. E sobre isso falamos pouco."
Segundo ela, é possível dizer com base em evidências que a religião ocupa um espaço que o Estado não alcança e que há uma naturalização da noção de que mulheres devem ser subservientes, não têm direitos e são responsáveis pelo relacionamento dar certo, muitas vezes, à base de sacrifícios. Evangélicas desde jovens e de origens distintas, a cearense Cássia, 42, a paulistana Viviane, 31, e a mato-grossense Maria, 45, compartilham históricos de violência doméstica desde a infância. Elas, que tiveram suas identidades alteradas por questões de segurança, contam abaixo detalhes de como eram agredidas. Cássia ficou casada 14 anos, até 2018, e teve três filhos. Abandonou a faculdade após crises de ciúmes do marido, que chegou a clonar seu telefone, persegui-la e, dentro de casa, estuprá-la.
No primeiro ano de casamento, já não estava feliz. Ele tinha ciúmes de todo mundo, fazia eu me sentir mal com meus estudos, meu trabalho e jeito de ser. Na época, eu achava que o problema estava em mim, que eu devia aprender a ser uma esposa melhor e obediente, que precisávamos ficar juntos a vida toda. É o que ouvíamos muito na nossa igreja. Ele era bombeiro e um homem fervoroso, considerado um fiel impecável e muito correto. Depois da briga, era buquê de flores. Então eu desabafava com as mulheres da igreja, com quem eu tinha mais contato, e elas me diziam: 'aguenta mais um pouco, pelos seus filhos', 'ele é muito bonzinho; perdoa, é só ciúmes'.
Conforme fui ficando mais distante e perdendo a vontade de estar com ele, pelas brigas e cobranças constantes, ele foi forçando relações sexuais. Dizia que meu corpo era dele, porque era meu marido, e isso estava na Bíblia. Eu chorava, reclamava, me debatia, mas não adiantava. No começo, achava que a culpa era minha por não desejá-lo, que eu provocava aquela raiva nele. Então eu orava muito para Deus mudar o meu coração e meu sentimento. Quando comecei a dizer que não aguentava mais, que queria me separar, ele, sem alterar a voz, me dizia que, se eu fizesse isso, tacaria fogo em mim e nos nossos filhos. (...) As violências começaram a ficar mais regulares e fui pedir ajuda na igreja. Contei o que estava passando a uma irmã mais velha e pedi ajuda para chegar ao pastor. Ela me falou assim: 'você não é a primeira a passar por isso e não vai ser a última, aguenta firme'. Aguentei por um tempo. Quando fui pedir ajuda ao pastor, já estava casada há uns 10 anos. Primeiro, ele sugeriu que nós fizéssemos um curso para casal. Depois, sugeriu que renovássemos nossos votos. Na cabeça dele, era tudo muito espiritual... Eu acreditava que, caso nada do que o pastor estava propondo desse certo, ele ia me ajudar, aconselhar meu ex-marido e pedir para me deixar em paz. Mas não, ele colocou a culpa em mim e disse: 'Irmã, você está orando pouco, você precisa colocar mais o seu joelho no chão. Se pedir o divórcio, a pecadora será você'. Ainda casada, Cássia procurou uma delegacia e diz que ouviu do delegado "que era só ciúmes de um homem apaixonado". Como o ex era bombeiro militar, ela teve medo de insistir na denúncia e, com ajuda algumas amigas da igreja, criou um plano de fuga: viajou dizendo que eram férias, mas nunca mais voltou. Depois, o ex se envolveu com outra mulher e foi preso por violência doméstica.
Em caso de violência, denuncie. Ao presenciar um episódio de agressão contra mulheres, ligue para 190 e denuncie. Casos de violência doméstica são, na maior parte das vezes, cometidos por parceiros ou ex-companheiros, mas a Lei Maria da Penha também pode ser aplicada em agressões cometidas por familiares.
Fonte: UOL
O relato de Cássia* e de outras mulheres ouvidas pelo UOL ajudam a explicar o número revelado por um estudo recente: 42,7% das evangélicas no país já sofreram violência doméstica. Segundo o último Censo do IBGE, os evangélicos são o grupo religioso que mais cresce no país. A pesquisa "Visível e Invisível: a Vitimização de Mulheres no Brasil", a primeira do Fórum Brasileiro de Segurança Pública que usa a religião declarada como indicador, considerou apenas as religiões cristãs e apontou que o número também é alto entre as católicas: 35,1%. "Não podemos concluir que ser cristã coloca a mulher em situação de maior vulnerabilidade", diz Juliana Brandão, uma das pesquisadoras do estudo. "Mas, ainda que seja necessário se aprofundar nos contextos sociais por trás dos números, eles acendem um sinal de que o papel das instituições religiosas também é um indicador a ser considerado em casos de violência contra a mulher. E sobre isso falamos pouco."
Segundo ela, é possível dizer com base em evidências que a religião ocupa um espaço que o Estado não alcança e que há uma naturalização da noção de que mulheres devem ser subservientes, não têm direitos e são responsáveis pelo relacionamento dar certo, muitas vezes, à base de sacrifícios. Evangélicas desde jovens e de origens distintas, a cearense Cássia, 42, a paulistana Viviane, 31, e a mato-grossense Maria, 45, compartilham históricos de violência doméstica desde a infância. Elas, que tiveram suas identidades alteradas por questões de segurança, contam abaixo detalhes de como eram agredidas. Cássia ficou casada 14 anos, até 2018, e teve três filhos. Abandonou a faculdade após crises de ciúmes do marido, que chegou a clonar seu telefone, persegui-la e, dentro de casa, estuprá-la.
No primeiro ano de casamento, já não estava feliz. Ele tinha ciúmes de todo mundo, fazia eu me sentir mal com meus estudos, meu trabalho e jeito de ser. Na época, eu achava que o problema estava em mim, que eu devia aprender a ser uma esposa melhor e obediente, que precisávamos ficar juntos a vida toda. É o que ouvíamos muito na nossa igreja. Ele era bombeiro e um homem fervoroso, considerado um fiel impecável e muito correto. Depois da briga, era buquê de flores. Então eu desabafava com as mulheres da igreja, com quem eu tinha mais contato, e elas me diziam: 'aguenta mais um pouco, pelos seus filhos', 'ele é muito bonzinho; perdoa, é só ciúmes'.
Conforme fui ficando mais distante e perdendo a vontade de estar com ele, pelas brigas e cobranças constantes, ele foi forçando relações sexuais. Dizia que meu corpo era dele, porque era meu marido, e isso estava na Bíblia. Eu chorava, reclamava, me debatia, mas não adiantava. No começo, achava que a culpa era minha por não desejá-lo, que eu provocava aquela raiva nele. Então eu orava muito para Deus mudar o meu coração e meu sentimento. Quando comecei a dizer que não aguentava mais, que queria me separar, ele, sem alterar a voz, me dizia que, se eu fizesse isso, tacaria fogo em mim e nos nossos filhos. (...) As violências começaram a ficar mais regulares e fui pedir ajuda na igreja. Contei o que estava passando a uma irmã mais velha e pedi ajuda para chegar ao pastor. Ela me falou assim: 'você não é a primeira a passar por isso e não vai ser a última, aguenta firme'. Aguentei por um tempo. Quando fui pedir ajuda ao pastor, já estava casada há uns 10 anos. Primeiro, ele sugeriu que nós fizéssemos um curso para casal. Depois, sugeriu que renovássemos nossos votos. Na cabeça dele, era tudo muito espiritual... Eu acreditava que, caso nada do que o pastor estava propondo desse certo, ele ia me ajudar, aconselhar meu ex-marido e pedir para me deixar em paz. Mas não, ele colocou a culpa em mim e disse: 'Irmã, você está orando pouco, você precisa colocar mais o seu joelho no chão. Se pedir o divórcio, a pecadora será você'. Ainda casada, Cássia procurou uma delegacia e diz que ouviu do delegado "que era só ciúmes de um homem apaixonado". Como o ex era bombeiro militar, ela teve medo de insistir na denúncia e, com ajuda algumas amigas da igreja, criou um plano de fuga: viajou dizendo que eram férias, mas nunca mais voltou. Depois, o ex se envolveu com outra mulher e foi preso por violência doméstica.
Em caso de violência, denuncie. Ao presenciar um episódio de agressão contra mulheres, ligue para 190 e denuncie. Casos de violência doméstica são, na maior parte das vezes, cometidos por parceiros ou ex-companheiros, mas a Lei Maria da Penha também pode ser aplicada em agressões cometidas por familiares.
Fonte: UOL
Conheça o livro que tem abalado o mundo religioso! Clique Aqui!
Participe de nossa enquete. Sua opinião é muito importante para nós! Clique Aqui e de seu voto.
Publicado em
NOTÍCIAS